A
mulherada não dava sossego pro homem mais lindo da vizinhança. Era uma
solicitude exagerada. Ele passava e só faltava fazer a feira de tanta
oferta de bolinhos, frutas, pedaços de queijo que vinham das fazendas,
convites pra almoços e jantares, peças de tricô que ganhava (ele já
tinha uns dez cachecóis e meias de tudo quanto é cor), recebia livros,
discos… Como vivia sozinho, aceitava tudo de bom grado e isso
amplificava sua simpatia. Estava longe da sua família que migrara há
algum tempo pra Rondônia pra tomar conta de umas terras. Preferiu ficar
na casinha que os pais lhe doaram em vida e permanecer no sudeste.
Não
se sabe de onde vinha tanta beleza. Nem o pai ou mãe tinham aquela
estampa. A irmã e os dois irmãos mais velhos também não. Se fosse num
conto de fadas, diriam que um dos seres encantados tinha espirrado sem
querer todo o conteúdo de pó mágico no berço dele. Olhava-se no espelho e
nem se achava tudo aquilo, mas… o que fazer se viam algo de tão
especial ali, né? Só podia achar bom.
Ninguém
o chamava mais pelo nome próprio, era simplesmente “o Pão”. Até os
amigos do trabalho só se referiam a ele assim. “Ô, Pão! O chefe tá
querendo falar com você…” A moça do cafezinho dizia: “Seu Pão, daqui a
pouco vou passar um café novinho.” As senhorinhas no ônibus comentavam:
“Pãozinho querido, se algum dia estiver pensando em se casar, tenho uma
netinha que faria um par ótimo com você…” . O Pão sorria e seguia
sozinho. Assuntos do coração ainda não tinham acontecido com aquela
convicção toda.
E
foi na fila da padaria que ele conheceu uma garota por quem seu coração
de pão se desmilinguiu. Ela estava escolhendo um bolo pro aniversário
da mãe. Cheia de dúvidas perguntava ao balconista os detalhes de cada
uma deles. “Esse aqui é de morango com recheio de quê?”. “O de chocolate
é meio-amargo ou daqueles bem doces?”. “Tem de nozes? Que dia foi
feito?” Não parava mais. O Pão achou engraçado aquela moça toda
explicadinha e tentou ajudar na decisão. “Eu prefiro sempre de
chocolate!”. Ela não achou graça. “Pega um de chocolate pra ele, o meu
ainda não escolhi…” O Pão ficou sem jeito e pediu desculpas pela
intromissão. Finalmente a moça apontou pra um dos bolos decorados: “Por
favor, pode ir embrulhando esse que já vou lá no caixa pagar”.
O
Pão pegou uns pãezinhos de sal, um bolo pequeno, um litro de leite e
uma bandeja de queijo fatiado. Correu pro caixa e ficou ali pertinho da
mocinha. Observou cada detalhe. Arriscou:
- Você mora por aqui? Nunca te vi antes. Eu sou o Pão… quer dizer, as pessoas me chamam desse jeito. Meu nome mesmo é…
- Eu sei quem é você.
- Você não vai levar um pão também? Tá quentinho, acabou de sair, olha!
- Engraçadinho… Não gosto de pão tanto assim.
- Assim como?
- Fresco. Prefiro pão dormido, murcho.
- Posso te procurar daqui uns trinta anos então?
Naquele instante, a garota mirou seriamente o rosto dele e pra sorte dos dois, nem o achou bonito demais.
fernanda takai
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