NO
ALPENDRE O TEMPO PASSOU
Lá estava ela, de
braços cruzados, no alpendre. Branquinha, olhos claros, cabelos longos e lisos
– sempre trançados. Às vezes corria pelo do quintal; era notório que
gostava de encostar-se na enorme mangueira, ou colocava-se a balançar pelas
cordas amarradas nos braços da mesma.
Por várias vezes
deixava-se escorregar no alpendre – propositalmente, parando à beira da
grade que separava a rua da casa: deliciava-se em fazer tal ato. Por outro
lado, preocupava aos mais velhos que, com voz quase de súplica, tentavam
impedi-la. Outros, menos preocupados, diziam que era para deixar a pequena
livre.
Do outro lado da rua,
também no alpendre de casa, via-a crescer. O tempo encarregava-se disso –
o tempo passava, às vezes lentamente, às vezes velozmente. Como aprendi a
dizer: depende do momento, da necessidade – é inegável que o tempo se faz
presente em todas as situações, e – na maioria das vezes, ao contrário do
que necessitamos, não é verdade?
Toda uniformizada
seguia para a escola – na época chamada de ginásio; anos depois, já
mocinha, para o colegial. E lembro-me que o seu uniforme – como da
maioria das que a acompanhava – era impecável. Nos dias de aulas de
Educação Física, de saia e camiseta toda engomada, tênis branquinho, deixava
todos os meninos da rua de plantão no portão. Na escola, tais dias, eram
ansiosamente esperados – pena que eram apenas duas vezes por semana.
Apesar de ser uma
escola pequena, segura, conseguíamos burlar os esquemas de segurança e, por
cima do muro, ficar observando as aulas de Educação Física. Ao lado da escola,
de onde observávamos as aulas, era uma pequena oficina metalúrgica do pai de um
aluno da turma – nota-se que, por este lado, meio caminho já estava
resolvido.
O tempo passou.
Crescemos – digo crescemos no sentido de pegarmos idade, de sermos pais
de família – e hoje, em rodas de conversa pegamos falando de assuntos de
anos que não voltam mais. Mas o registro é válido, é tão válido que passados os
anos, a velhice se aproximando, mas os fatos ainda permanecem vivos.
Assim a sua imagem
ficou registrada em minha memória; assim também creio que outras branquinhas de
olhos claros ficaram na mente de muitos; assim como também muitas morenas
ficaram marcadas nas retinas de nossos olhos leitores; assim como também as
afro-descentes, como as dos países orientais. São marcas que jamais serão
apagadas.
São marcas que cada
leitor tem a sua, independente do lugar que morou, do lugar que estudou –
pois os vizinhos se fizeram presentes em nossas vidas, assim como a escola se
fez presentes também. E esta com suas exigências que nos fez crescer e sermos o
que somos hoje: cidadãos de bem – e cada um seguindo o caminho que foi
traçado desde os tempos mais antigos que se possa ter notícia, apesar de este
que vos escreve acreditar, até certo ponto, no livre arbítrio.
E hoje, de novos
alpendres, de novas sacadas ou de algum lugar não citado aqui, mas criados por
nossas mentes prodigiosas, conseguimos ver muitos cidadãos sem destino –
principalmente os mais jovens que só pensam em curtir, e sem responsabilidade
– e ficamos a pensar internamente, remoendo: no meu tempo não era assim.
Eram outras as prioridades do alpendre! 30/05/2013
–
Pedro César Alves é professor e jornalista, MTb nº 71.527 / SP, membro da
UBE – União Brasileira de Escritores.
www.aracatubaeregiao.com.br - site pessoal.tela: avelino de araújo/RIO GRANDE DO NORTE
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