quinta-feira, 11 de outubro de 2012

ANIVERSÁRIO DE TOM ZÉ





>querido ídolo e amigo TOM ZÉ, eis aí algumas perguntinhas para voce, não querendo abusar de SUA boa vontade,evidentemente. Comecei a ouvir a sua música nos anos 82, quando comprei ainda em vinil o clássico " TODOS OS OLHOS",numa banca de revistas e jornais,em BAURU/SP. Em maio, nosso site cultural telescopio, completará 13 anos no ar, sempre apoiando e divulgando seu maravilhoso trabalho.

1) COMO VOCE DEVE SABER ( Dona Neusa,deve ter-lhe contado),sou fã de NARA LEÃO,E FICO IMAGINANDO ALGUMAS CANÇÕES SUAS QUE PODERIAM TER SIDO GRAVADAS POR NARA, ASSIM COMO GAL COSTA,OS MUTANTESE OUTROS FIZERAM. COMO FOI SEU RELACIONAMENTO MUSICAL E TROPICALISTA COM NARA, SENDO ELA UMA ARTISTA QUE ACEITAVA A CHEGADA DA TROPÍCÁLIA ,E TAMBÉM REJEITAVA A MARCHA CONTRA AS GUITARRAS FEITA COM A PARTICIPAÇÃO DE ALGUNS ARTISTAS IMPORTANTES NAQUELA ÉPOCA?
COM NARA LEÃO A PROXIMIDADE FOI MUITO POUCA. MOMENTOS DA CARREIRA E DO PERCURSO DA VIDA DE AMBOS NÃO PERMITIRAM GRANDE APROXIMAÇÃO. EU ESTAVA NA UNIVERSIDADE DE MÚSICA DA BAHIA, FAZENDO TENTATIVAS EM MÚSICA POPULAR. NUNCA É DEMAIS REPETIR: ELA É UMA DAS MAIORES INTÉRPRETES DO QUE CHAMAMOS DE MÚSICA POPULAR BRASILEIRA. É UM GRANDE DISCERNIMENTO, UMA SENSIBILIDADE ÚNICA.

2) PELO QUE OBSERVEI, O APARECIMENTO DA TROPICÁLIA NÃO PODE SER ATRIBUIDO AO ROCK INTERNACIONAL OU MESMO Á GENÉTICA MODERNISTA OSWALDIANA - CLARO QUE HOUVE INFLUÊNCIA ESTÉTICA DESTES , MAS PARECE-ME QUE A TROPICÁLIA FOI SE REINVENTANDO A SI MESMA DESDE A CONVIVÊNCIA DOS TROPICALISTAS COM SEUS CANTADORES, SEU ANALFABETISMO ARISTOTÉLICO,A HERANÇA SONORA DAS LAVADORAS DE ROUPA E FOLCLORISTAS DO SERTÃO, E NO SEU CASO, DEVERIA FALAR TAMBÉM SOBRE OS MAESTROS JOAQUIM KOELLREUTTER E ERNST WIDMIER, É ISSO?
EVERI, RESTA-ME ASSINAR EMBAIXO. CADA UM DESSES NOMES OU CIRCUNSTÂNCIAS FIZERAM PARTE DA FUNDAÇÃO. NO MEU CASO PESSOAL, TANTO KOELLREUTTER COMO WIDMER TÊM UMA PRESENÇA COMPARÁVEL à DOS CANTOS DE TRABALHO DE MINHA TERRA.

3) OUVI PELA PRIMEIRA VEZ, O DISCO "TODOS OS OLHOS",EM 1982, E NUNCA MAIS ME "RECUPEREI" DA GRANDEZA DESTE TRABALHO SEU, no QUAL HAVIA A PARTICIPAÇÃO DO ODAIR CABEÇA DE POETA, É UM TRABALHO ÍMPAR COMO VÁRIOS OUTROS DE SUA AUTORIA, COMO FOI FAZER ESSE DISCO NA ÉPOCA? A EMOÇÃO, O TRABALHO MUSICAL, A PESQUISA, OS MÚSICOS, SUA INSPIRAÇÃO? EU SINTO QUE "TODOS OS OLHOS" ASSIM como "ESTUDANDO O SAMBA" , SÃO REFERÊNCIAS ESTÉTICAS INTERNACIONAIS E HISTÓRICAS.
QUANDO VOCÊ FAZ UM TRABALHO QUE LHE TOMA CADA CÉLULA, PARADOXALMENTE, PODE NÃO CHAMÁ-LO DE MARCO, GUIA; NEM SEMPRE O CHAMA DE “DUCA MIO” – LEMBRANDO DANTE, NA “DIVINA COMÉDIA”. EU PRECISAVA FAZER, PRECISAVA CUMPRIR AQUELAS PALAVRAS E COMPASSOS QUE ESTÃO LÁ. O QUE VINHA FAZENDO EM MÚSICA, O QUE APRENDI ATÉ ENTÃO, FORAM DESPEJADOS PARCIALMENTE LÁ. FOI UM DISCO IMPORTANTE, EMBORA TIVESSE ME TIRADO DOS MÍDIAS POR LONGO TEMPO.MAS FOI UM FELIZ EXÍLIO, ERA NECESSÁRIO.

4) SEUS DISCOS NUNCA "ESTOURARAM" NAS PARADAS DE SUCESSO, COMO FIZERAM OS TRABALHOS DE CONTEMPORÂNEOS SEUS COMO GAL, CAETANO, BETHÂNIA, GIL,CHICO BUARQUE - PORÉM, SEU TRABALHO SE MANTÉM EXPLOSIVO,ESSENCIAL, NECESSÁRIO ,enquanto que o de alguns artistas perdem vinco,perdem aquela coloração vistosa de outrora- mas TOM ZÉ CONTINUA COLOCANDO DINAMITES NOS PÉS DO SÉCULO 21 COMO NINGUÉM, NUMA ÉPOCA TÃO SOFRIDA E BARBARIZADA - COMO REAGIR DIANTE DESTA GLOBARBARIZAÇÃO QUE SUFOCA A EDUCAÇÃO, A SAÚDE, A CULTURA, E TUDO MAIS?
ALGUNS ARTISTAS PINÇAM A VEIA DA POPULARIDADE COM BOAS CANÇÕES. ELES CONSEGUEM SE EXPRESSAR NUMA LINGUAGEM MAIS DISSEMINADA, COM MOTES E RIMAS QUE O PÚBLICO DESCOBRE QUE QUER CANTAR. EU, QUE SONHO CANTAR NA ESTAÇÃO RODOVIÁRIA, QUE COMPONHO PARA AS PESSOAS QUE VEJO LÁ, QUE AMO AQUELES ROSTOS, EVIDENTEMENTE ME EXTRAVIO. MINHA FORMA PARTE PARA OUTROS RUMOS. COMO MAIAKÓVISKI, GOSTARIA DE PROFETIZAR QUE OS DESTINATÁRIOS AINDA COMERÃO O BISCOITO QUE FABRICO. NÃO PROFETIZO, MAS A INTENÇÃO DE QUE ISSO ACONTEÇA PERMANECE.
A GLOBARBARIZAÇÃO SE APOIA NO MERCADO, SEM DÚVIDA. SENDO JUSTO, O MERCADO TEVE OU TALVEZ TENHA – CONHEÇO-O POUCO - PRODUTOS INTERESSANTES. PENA É QUE NÃO SE APOSTE NUNCA NA BELEZA DIFÍCIL.

5) GLAUBER ROCHA EVIDENCIAVA EM SEUS FILMES O APÊLO NORDESTINO AO MUNDO MÍSTICO,RELIGIOSO, ATÉ COMO UMA ESPÉCIE DE ALIENAÇÃO - PORQUE GLAUBER TALVEZ ACREDITASSE MAIS NUMA REAÇÃO DO HOMEM CONTRA AS INJUSTIÇAS QUE O CERCAM - QUERO COM ISSO SABER SOBRE O SEU INTERESSE PELOS TEXTOS BÍBLICOS, OS QUAIS ALÉM DE SUA BELEZA POÉTICA NOS SALMOS E OUTROS TEXTOS , PODEM NOS INFLUENCIAR Á REAGIR TAMBÉM CONTRA OS DRAGÕES DA MALDADE (OS MAUS GOVERNANTES, AS INJUSTIÇAS SOCIAIS, a pobreza absurda, as mentiras dos políticos corruptos,AS GUERRAS URBANAS CONTRA AS DROGAS e o crime organizado, ETC...) ?
VOCÊ TOCOU NUM PONTO CURIOSO: QUANDO LI A BÍBLIA, O VELHO TESTAMENTO, EM PARTICULAR, ME SURPREENDEU COM RELATOS QUE CONTRARIAM A MORAL DO CRISTIANISMO. PARA FICAR NUM SÓ EXEMPLO, JUDITE E HOLOFERNES. O “O LIVRO” TEM HISTÓRIAS BÉLICAS, DA PROFUNDEZA DOS TEMPOS, NARRATIVAS QUE CONQUISTARAM UM AUTOR ABSOLUTAMENTE MÁXIMO COMO THOMAS MANN. NÃO CASUALMENTE, AS FILIAÇÕES RELIGIOSAS, EM SEU RIGOR, SE REPORTAM MAIS AOS PROFETAS, AOS SALMOS, À VIDA DO CRISTO. ME INTERESSA MUITO NA BÍBLIA A HISTÓRIA DE POVOS QUE ELA COLETA. É UM LIVRO PROFUNDAMENTE INFLUENTE. E SE VOCÊ SE LEMBRAR, AQUI NO BRASIL, FREI BETO, UM HOMEM DECENTE, VERÁ QUANTO E COMO A PALAVRA BÍBLICA O INFLUENCIA. COMO O RIO POTENTE QUE LIMPOU AS CAVALARIÇAS DE AUGIAS.


6) VOCE JÁ TEVE CONTATO COM AS ARTES PLÁSTICAS,em museus , COM A OBRA DE Johannes Vermeer, PINTOR HOLANDÊS, como foi? O tropicalismo soube apreender,a aceitar livremente diversas outras linguagens estéticas,e antropofagicamente assimilá-las. Hoje, neste sentido , pode-se dizer que necessitamos de mais tropicalismos? mais ousadias,transgressões culturais e comportamentais?
UM MEIO ARTÍSTICO DE OUTRA NATUREZA, COMO A ESCULTURA, A PINTURA, A LITERATURA, A POESIA, PODEM ME ESTIMULAR MAIS DO QUE UMA PEÇA MUSICAL CASUALMENTE OUVIDA. VOCÊ PERGUNTA SOBRE VERMEER. ANDEI UM MUSEU INTEIRO PARA VER UM QUADRO DELE, SEM PARAR DIANTE DE NENHUM OUTRO QUADRO ANTES. A SURPRESA INICIAL FOI QUE O QUADRO, “A RENDEIRA”, É PEQUENINO. A DELICADEZA DO BRANCO APLICADO NA TELA, A SUTILEZA, ME FIZERAM DESCOBRIR: “MAS ISSO É JOÃO GILBERTO!” ESSA TELA EU VI NO LOUVRE E INDO AO METROPOLITAN DE NOVA YORK NO ANO PASSADO VI ALGUNS VERMEER QUE ELES TÊM LÁ.

SOUBE HOJE QUE VIRÃO AO CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL, EM SÃO PAULO, TELAS IMPRESSIONISTAS DO D’ORSAY. VALE UMA PEREGRINAÇÃO, VALE SAIR DE QUALQUER CANTO DO BRASIL PARA VIR CÁ, APESAR DE O CCBB SER PEQUENO PARA O TANTO DE GENTE QUE DECERTO VIRÁ VER MONET E SEUS PARES. DESLUMBRAMENTO, A ARTE É PRA SER ISSO.

OLHE, TRANSGRESSÕES COMPORTAMENTAIS SÃO TANTAS E TÃO FREQUENTES QUE NÃO SEI SE A NECESSIDADE AS CONVOCA COM TANTO EMPENHO COMO HÁ TRINTA, VINTE ANOS. TRANSGREDIR É POSE, OU VIROU NORMA. QUANTO À TRANSGRESSÃO ARTÍSTICA, SEMPRE HAVERÁ ARTISTA DE TUTANO PRATICANDO. FICO SÓ OLHANDO E PROCURANDO.


7)BELLA BÁRTOK E VILA-LOBOS estudaram a música folclórica de seus respectivos países com profundidade - não acha que o BRASIL AINDA PRECISA CONHECER esses outros brasís musicais? Sei de afinações de viola de diferentes modos em Goáis, outras bases rítmicas, com precedentes históricos na cultura árabe, INCLUSIVE -mas nada disso é vinculado em TV, salvo em raras exceções.
O FOLCLORE DA MINHA TERRA É ENCANTADOR. EU TINHA PEDIDO A ALGUÉM DE IRARÁ QUE COLETASSE CERTA MODALIDADE DE CANÇÕES LÁ, O PREGUIÇOSO DO MENINO NÃO FEZ ISSO. FOI BOM VOCÊ ME LEMBRAR, VOU VOLTAR À CARGA.

ESTOU ME LEMBRANDO DE UMA CANTIGA DE RODA OUVIDA HÁ UNS 40 ANOS, SENHORA DONA SANCHA / COBERTA DE OURO E PRATA / DESCUBRA SEU ROSTO / EU QUERO VER A PRATA. ALGUÉM CORRIGIU DIZENDO QUE É EU QUERO VER SUA CARA. QUALQUER VERSO DOS DOIS É BOM.
A UNIFORMIZAÇÃO PRATICADA PELOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO ENTERRA A VIDA DO FOLCLORE. SIM, SERIA BOM CONHECER MUITO MAIS.



8) PELO QUE A DONA NEUSA ME CONTA, TOM ZÉ E SUA EQUIPE DE MÚSICOS TRABALHAM MUITO! MAS COMO É TOM ZÉ EM CASA,O QUE GOSTA DE FAZER? QUE AUTORES E FILMES GOSTA DE APRECIAR, COMO É TRABALHAR O SEU DESCANSO? EU PRATICO TAI CHI HÁ 21 ANOS E MINHA VIDA TEM SE APOIADO NISSO -- COMO O TAI CHI CHUAN EM SUA VIDA?

EU ME DIVIRTO MUITO VENDO OU OUVINDO FUTEBOL. ESPERO PELOS JOGOS, ACOMPANHO CAMPEONATOS.ATÉ POUCO TEMPO ANDEI REVENDO FILMES DE BERGMAN. AQUELAS MULHERES, AQUELAS ATRIZES!
TENHO FEITO OUTRAS MODALIDADES DE GINÁSTICA, MAS O TAI-CHI É UMA BASE SEMPRE PRESENTE. PRETENDO RETOMAR.


9) NA TROPICÁLIA, PERCEBI QUE JORGE MAUTNER sofreu influência da cultura beatnick, já nos seus primeiros livros de meados de 60 - voce foi convidado por CAETANO VELOSO A OUVIR O DISCO SARGENT PEPPERS dos BEATLES aí por volta de 67, como foi essa experiência? E voce, chegou a ler os ESCRITORES beats como GINSBERG, NEAL CASSADY, KEROUAC ?
NÃO POSSO DIZER QUE OS BEATLES FORAM UMA INFLUÊNCIA. SÓ DÉCADAS DEPOIS FIZ ARRASTÃO DE UMA DAS MÚSICAS DELES. ARRASTÃO NÃO É UMA TRANSCRIÇÃO, É SEMPRE UM TRABALHO SOBRE, COMO UM REBORDAR DE TECIDO, MISTURANDO TRAMAS. CONHEÇO POUQUÍSSIMO DA LITERATURA BEATNIK. TALVEZ EU SEJA POUCO URBANÓIDE, POUCO URBANIZADO. SE LEIO UNS PARÁGRAFOS DE JOYCE, FALANDO DE SUA DUBLIN, MINHA MENTE RESPONDE IMEDIATAMENTE, UMA AFINIDADE SUSPIRA. VOU TENTAR, QUALQUER DIA, QUALQUER HORA, OLHAR DE NOVO OS BEATNIKS.
MAS ENTRE JOYCE, NO CONTO QUE INSPIROU O FILME QUE EM PORTUGUÊS É “OS VIVOS E OS MORTOS”, SE É QUE HÁ PLURAL NESSE TÍTULO, BEM COMO EM OUTROS DE “RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM” OU NA LINGUAGEM FORTEMENTE POÉTICA DE “ULISSES”, AH, NÃO TENHO DÚVIDA, É DIFÍCIL ENCONTRAR OUTRO CRIADOR QUE OLHE SEU ENTORNO E SUA ÉPOCA COMO ELE. E GUIMARÃES ROSA, FALANDO DE NOSSA ALMA BRASILEIRA.

10) VOCE RE-OUVE OS SEUS TRABALHOS, O QUE VOCE ESTÁ OUVINDO RECENTEMENTE?
">NÃO É UMA AUDIÇÃO SISTEMÁTICA, OUVIR DE NOVO MEUS PRÓPRIOS DISCOS. QUANDO QUERO LEMBRAR COMO FOI QUE FIZ AQUELE TRECHO DA CANÇÃO TAL, COMO FOI A INSTRUMENTAÇÃO, OU OUTRO DETALHE, OUÇO DE NOVO.EVERI, HÁ MUITOS MESES OUÇO VÁRIAS VEZES POR SEMANA, SEMPRE QUE POSSO, OS QUARTETOS TARDIOS DE BEETHOVEN. SÃO ESPECIALMENTE COMPLEXOS E INTERESSANTES.

abçs do sempre fã
everi rudinei carrara
araçatuba, 11 de outubro de 2012

colaboração: clevane lopes

Nenhum comentário: