quarta-feira, 9 de abril de 2014

Ênio José Toniolo



MARÇO DE 1964
Em março de 1964 eu era calouro na Universidade Federal do Paraná. Vivi tudo. O governo Jango (em quem eu tinha votado) era fraco e confuso; a corrupção corria solta, embora menos ostensiva que hoje;  greves pipocavam por toda a parte; a inflação beirava os 90% e o PIB diminuiu 2% num ano. O país andava devagar, quase parando. A maioria do povo e da imprensa praticamente imploravam a derrubada do governo, e a conspiração foi de início encabeçada pelos civis: governadores Lacerda, Ademar, Menegheti e Magalhães Pinto.  Ney Braga, da esquerda católica, ficou em cima do muro o quanto pôde. A população saiu ordeiramente às ruas,  nas imensas Marchas da Família com Deus pela Liberdade. As fotos estão aí, nas coleções de jornais.  As Forças Armadas saíram dos quarteis quando os janguistas começaram a quebrar a sua disciplina.
Dia 31 (e não primeiro de abril, como às vezes inventam) o general Mourão Filho desceu de Minas, deu a partida,  e o castelo de cartas desmoronou sem um tiro sequer. Os “defensores do povo”,  que juravam estar prontos a morrer por ele,  pegaram suas malas de dinheiro e refugiaram-se nas embaixadas e nos países vizinhos.  Fala-se na ajuda ianque; mas no enfrentamento com a URSS leninista, que esperar dos Estados Unidos?  Que aplaudissem a provável vitória  vermelha no Brasil?  Ora, não sejamos tão ingênuos!
Os desfiles de agradecimento às Forças Armadas, nos primeiros dias de abril,  foram monumentais e mostravam de que lado estava a opinião pública.   Mas esperava-se que a intervenção militar fosse cirúrgica e de pouca duração, já que os governadores, vários deles candidatos à presidência, ansiavam pela eleição de 1965. Nada feito: os generais gostaram do poder, ou desconfiavam dos civis.
Começaram os ataques gerrilheiros e terroristas, com a desculpa de “retorno à democracia”. Pura propaganda enganosa. A escola deles, no sentido literal e figurado, era a ditadura cubana, onde vários deles estagiaram – e fizeram cirurgia plástica...  Claro que houve prisões, torturas e mortes. Era uma guerra, e pouco limpa. As luvas de pelica ficaram no tempo dos Três Mosqueteiros. Quem realmente pelejou pela redemocratização foi o PMDB. E, quisessem ou não, deu nisso que está aí.
No balanço: de dois males, devemos escolher o menor. Em 1932, São Paulo merecia torcida contra Getúlio; em 1939, os Aliados eram melhores que o Eixo;  em 1964,  os militares eram preferíveis à República Sindicalista em gestação.
 TELA: SALVADOR DALÍ
Ênio José Toniolo

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