terça-feira, 4 de agosto de 2009

LIVRO DE ROSÂNGELA VIEIRA ROCHA


FOME DE ROSAS
Toda semana recebo alguns livros em casa - amigos com seus lançamentos, escritores em busca de novos leitores. Ganho muito mais livros do que consigo ler. Porque além destes que chegam até mim, ainda há os outros, que compro com o desejo de conhecer. Há uma pilha de obras aguardando minha leitura. Então, infelizmente, tive de adotar um critério: para que eu não tenha de simplesmente abandonar os livros que ganho em um canto, leio as três primeiras páginas de todos. Se resistirem à leitura, provando sua qualidade, sigo até o final.
Não tenho tempo sequer de agradecer a todos os que me enviam suas obras, que gastam tempo e dinheiro envelopando sua esperança e me destinando um alô. É uma questão de tempo sim, de forma que, como encaro a literatura como meu segundo trabalho, sou "obrigado" a ler de cem a duzentas páginas todos os dias. Mas o mesmo critério eu uso com os escritores consagrados: se eu não julgar que fizeram um bom trabalho, também não passo das três primeiras páginas. Se alguém me recomenda e a leitura engasga pela falta de qualidade, tento chegar até a décima página para ver se é só uma questão de tipo.
Uma história que me pegou de jeito foi a de "Fome de rosas", de Rosângela Vieira Rocha. Li três resenhas sobre este livro, publicadas em jornais e sites. Como não escrevo mais críticas literárias e estou correndo de jornal, vou tentar contar algo diferente sobre o romance. A respeito da escritora, quem quiser saber mais, digite o seu nome no Google e veja o que acontece.
Para ser honesto, o título não me incentivou muito e a capa também não me ajudou. Mas é uma questão de gosto, vejam bem: gosto. Porque tanto a capa quanto o título são muito coerentes com a mensagem que Rosângela pretende passar. Mas não me iludi - sou daqueles que acham que um texto não se vende pela capa ou por um título somente. Não me arrependi.
Vamos primeiro à história. Rosângela começou a trama no momento preciso para laçar o leitor: no enterro de um jovem e poderoso advogado, morto em um acidente de carro. Lisandro deixa mulher (Ariadne) e duas filhas (Letícia e Alice). Até aí tudo bem. O que não gostei muito nas críticas que li foi a atenção exacerbada que deram à personagem Alice. Ótimo, mas o livro é mais do que isso.
Letícia é uma jovem de vinte e um anos e Alice uma mimada garota-problema de 13. Com a morte do pai, Letícia vê-se obrigada a cuidar da família, que vivia confortavelmente em uma mansão, onde alienavam-se Ariadne e Alice. A filha mais velha decide que não quer esse fardo para si, abandona o curso de Direito no último ano e segue com o marido para a Alemanha, onde ele fará seu doutoramento e ela cuidará da casa. Rosângela trata de forma superficial da questão do imigrante, pois não é seu objetivo se aprofundar sobre isso, mas é muito feliz ao retratar de maneira poética a solidão em um novo país.
Alice é uma pré-adolescente que fica menstruada no dia da morte do pai - e é emblemática essa sutil união de sangues. Gordinha, decide perder peso sozinha, comprando dezenas de livros sobre dietas. Faz exercícios, controla a alimentação e em alguns meses se vê quinze quilos mais magra, ao custo de negligenciar a escola e de se tornar paranóica com o corpo. É um dos méritos do livro: discutir e apresentar de forma detalhada e certeira o processo de desenvolvimento de duas graves doenças: a bulimia e a anorexia. Alice tem em casa modelos de beleza: a mãe e a irmã e decide fazer o que está ao seu alcance para ficar como elas. Rosângela Vieira mostra o perigo da Internet sem fiscalização, os efeitos dos conselhos de amigos virtuais na disseminação de bobagens, as consequências do abandono, já que Ariadne decide, após anos se dedicando à família, cuidar um pouco de si e retomar um antigo relacionamento com um empregado de seu ex-marido.
É uma questão pessoal, mas achei muito interessante o aparecimento da cantora Karen Carpenter na narrativa. Carpenter foi um caso que ganhou a mídia do final dos anos 70, quando começou a emagrecer desenfreadamente e chegou a morrer em 1983, com problemas no coração, decorrentes da anorexia. É um assunto bastante atual, tendo-se em vista a exigência de modelos cada dia mais magras. Usuários do Protoshop criam ilusões, capas de revistas com mulheres perfeitas, sem celulite, sem estrias, com a barriguinha malhada e com um rosto sem marcas. Os recursos de luz e destreza fotográfica de antigamente me pareciam mais honestos.
O mérito de Rosângela está no seu modo de escrever, sem rodeios. Ela sabe contar uma história sem se posicionar criticamente sobre o tema, o que não quer dizer que o livro não trate a questão de maneira crítica, evidente. Ela simplesmente narra os fatos, o que é importante em se tratando de um ponto tão delicado. Se a autora tomasse um partido, o livro poderia descambar para a defesa gratuita de um preconceito.WHISNER/ www.cidadedevolvida.blogspot.com

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