segunda-feira, 22 de outubro de 2012

LUIZ ROSEMBERG FILHO

                         “POR UM MARCO REGULATÓRIO, JÁ!”

         Na esperteza bárbara do capital, o imaginário foi transformado num lixão. Numa espécie de celebração de uma completa aniquilação do saber. Digamos que a TV e o cinema são hoje uma afirmação militar-religiosa  de negação da sensibilidade a serviço da alienação. Basta que se veja aqui, a partilha do culto da barbárie explicitando com o espetáculo vazio, uma defesa escancarada do  nivelamento mais  baixo possível  do espectador da imagem e do som.  E isso nos conduzindo a quê?
         Ora, como entender os excessos no uso do feio, do porco, da anomalia e da violência nos meios de comunicação, vinte e quatro horas por dia? Meses, anos e décadas sendo repetindo como as novelinhas e seus papagaios!  Que tipo de sensibilidade tem um programa como o dos senhores Ratinho, Datena, Gugu ou mesmo Faustão? Onde se vê em todo esse lixo, a exuberância plena do exercício criativo da vida? Na Xuxa? Digamos que a TV vem transformando o hábito de pensar numa perda de tempo previsível. O ritual é “se virar nos trinta”, e dar vez a boçalidade dos programas de auditório e religiosos. Todos, uma circularidade ideológica de aberrações. E através dessa máscara, o sorriso libidinoso do poder de famílias mais próximas dos porcos, que dos humanos.
         Sim, nos causa horror o ambiente deformativo da mídia no Brasil, onde o país deixa de ser ousado e criativo para se transformar numa retransmissão de velhos discursos fascistas de Sarney, aos enfadonhos programas religiosos na TV. E existe pior crueldade para o telespectador que ver e ouvir pedirem dinheiro em nome de deus? Não conseguimos explicar a nós mesmos, tal estado de fanatismo e atraso servindo aos canais de televisão. Honestamente, é o quê?
         Também não somos visionários, nem delirantes mas queremos  a curto prazo, uma política para as comunicações bem              ousada e criativa. Ora, como se pode formar um povo mais preparado e profundo com essa enxurrada de aberrações todos os dias. Como podem, declarados inimigos da cultura brasileira, serem donos de redes de televisão, rádios e jornais? Televisões, rádios e jornais que só trabalham o embrutecimento como forma de pensar e viver. Que lucram muito com os desvios de uma  mídia comprometida  com o espetáculo vulgar, venal e intimidador!
         Bem, antes defendíamos um país verdadeiro para todos. Não confundir com “o país de todos”. Hoje, o balizamento do saber passa pela monstruosidade de uma burocracia infernal, beneficiando claro, as velhas múmias do passado. Também não lamentamos, nem defendermos o lixo como luxo. Ainda ontem queríamos uma real reforma agrária da terra e do ar. Hoje defendem a polícia fantasiada de pacificadora, dimensionando-se uma “normalidade” enloquecida para com o dinheiro, aliado ao “sucesso” sem consistência alguma. Temos sim, uma mídia corrupta e comprometida com escândalos e inutilidades. Mas...como podem querer um país e um povo melhor?
         Com muitas dificuldades, volta a se falar num Marco Regulatório para a mídia! Marca, marco, chão! Nossas origens e as famílias econômicas, políticas, culturais e tradicionais; excedentes em poder, prepotência e capital. Despotismo e cinismo, estão a necessitar de um novo marco diferente da marca de seu marketing. Para que passem a exceder menos e a regular menos. E como marco de um povo adulto e que já busca autonomia como negação de sua história de dependência, submissão e escravidão de agrados e compensações de suas necessidades administradas e dinamizadas pela economia, a cultura, a divisão de trabalho e sob essa solidez que temos que fazer se desmanchar no ar – os meios absolutos e particulares de comunicação!
         E sempre que um processo social e mais democrático evolui para uma melhor participação do andar de baixo, tudo se acelera para uma negação, como ocorreu com o neoliberalismo e a desregulamentação dos bancos, do mercado e da própria mídia. E hoje já não possuímos mais blocos históricos pensando nessa história e na força de uma dialética como fenômeno, razão, significação e mudanças dessa trágica e permissiva realidade. A semana de Arte Moderna de 22, poderia nos ter sido o maior marco de nosso bloco histórico. Mas não foi. E Mário de Andrade soube rebelar-se contra isso, definindo a Semana de aristocrática e perigosa, num país de povo sem identidade. E o que se buscava ali, naquela Semana, era uma pequena diferença numa identidade que já tinham: riqueza, poder e execedências! E se a nossa realidade se tornar aina mais difícil, apelemos para um plebiscito!
         Mario de Andrade saiu em campo, removeu o solo tentando encontrar nossas raízes emblemáticas, sem forma, distorcidas e comprometidas. Já envenenadas com agrotóxicos e transgênicos no DNA, endurecendo sua macroestrutura de futuras análises e alterações. Com esse Marco Regulatório que se busca e com as dificuldades já esperadas também na superestrutura de prepotências no solo e no ar. Na física e metafísica e nas significações. Naturais, fundamentalistas e absolutistas de religião, poder, capital e comunicação. Mario rodou o Brasil, rodopiou, chegando até o Peru. Com vontade, conhecimento e solidão; foi longe demais! Produziu muito. Criou muito. Inclusive inimizades! Ficando sem porto. Num país com tantos. E nenhum, para o seu barco cheio de arte, beleza e poesia. E para que, no lugar de um povo só exótico e do futuro, a imagem do presente não escapasse e para que esse futuro não fosse tão distante e tão irreal como essa realidade das televisões e das comunicações da mídia criminosa. Em meio a tantos marcos intransponíveis, Mario teve de seguir a tradição de Édipo, refugiando em Colono. Refugiando-se em sua solidão!
         Mario, Florestan Fernandes, Celso Furtado, Caio Prado, Glauber Rocha... tantos outros, já nos iniciaram. Mexer com esse marco essencial em nosso DNA, só com vara mágica. A de nossos mitos. A de nossa música e de nossa mística – com todos, tudo e nada! Esta significação de um novo tempo. Enquanto nos mantemos vivos e crentes em nossos princípios, meios e fins. Tão distantes e que não podem terminar. Só como transfiguração, o solo de Nietzsche. Aquele que ele teve em Turim, onde hipotecou o seu quadragésimo quarto aniversário: na loucura! Na descoberta de si mesmo. Com esse nada que conseguiu ultrapassar! Assentando-se definitivamente em seu próprio solo, como já disse Antonio Olinto, sobre o próprio Nietzsche. Em Turim, cidade que Olinto conhecia bem, a mais grave das leis: a da gravidade. Que havia prendido os pés do filósofo ao chão com mãos, corpo e cada parte de si mesmo. Ligando a ele um inteiro sistema de vida, de frutos e pensamentos, sonhando ao mesmo tempo e fazendo-o, sentir-se. E existir!
         Daí a importância de nossa territorialidade, do nosso comportamento e de nossa existência bem estruturada histórica e culturalmente. E é assim que precisamos nos sentir com esse novo Marco Regulatório das Comunicações. Ou seja, precisamos desfazer este país de famílias, de milícias, de máfias e ocupações militarizadas. E nenhuma delas interessa ao povo. Econômica, política e cultural. Todas de solo, de ar, de marcas e marcos envenenados. Necessitamos de uma Lei da gravidade como assentamento de nossos pés no chão. E como um nosso regulamento de existência e realidade. E, daquilo que também nunca tivemos, visibilidade de um pensamento mais transparente e sólido. Pois o que existe e resiste desde a Proclamação da República são máscaras que justificam a barbárie como espetáculo nos meios de comunicação!   


                     Luiz Rosemberg Filho e Sindoval de Aguiar
                                                   RJ, 2012  

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